Durante o almoço.
Macarrão com atum.
vó: eu fui lá ontem, e ela tava feliz sabe? ela e aquele gato, sabe, aquele que eu te disse, aquele que se dá bem com o cachorro?
mãe: ahhh, sei, aquele preto.
vó: esse mesmo. o preto.
kéky: o gato preto ou o cachorro que era preto?
vó: não era. é.
kéky: o gato? ou o cachorro?
mãe: foi uma moça lá hoje também, abatida coitada.
kéky: ãhn? foi onde? no salão?
mãe: não, na feira.
(as duas riem)
vó: é. é difícil mesmo começar de novo.
mãe: mas ela tava bem, até tingiu o cabelo...
kéky: passa o palmito?
mãe: tá mais perto da vó
vó: de que cor?
kéky: quem tingiu o cabelo?
mãe: aquela que o marido gostava.
kéky: que marido?
mãe: aquele que morreu.
kéky (num lapso mental): muita gente tá morrendo né?
vó: é. se tá vivo morre né?
kéky: eu sei, mas é muita gente que tava viva, e perto da gente.
mãe: eu não tenho nenhum morto perto de mim.
vó: ahh precisava ver os pasarinho comendo banana lá no quinta hoje.
kéky: mas quem era a mulher?
mãe: uma ai. e esse macarrão tá mesmo muito gostoso.
kéky: e foi o marido dela que morreu?
mãe: nãão, kéroly. o cachorro.
(as duas riem de novo).
kéky: lembra quando as pessoas morreram por comer palmito? lembra mãe?
mãe: ahh kéroly. na hora da comida não.
oh céus.
já que nada seria mesmo se não fosse.