Bege
Ela digita rápido, com a pressa de parecer completa nas linhas da conversa da Internet. Com tanta pressa que ela mal sabe porque quer que seus dedos sejam rápidos quando na verdade, ela não está fazendo nada além do normal.
Visita os sites de sempre, de amigos, de fotos, de textos, de horóscopo; mesmo que tenha entendido que é impossível que todas as pessoas de touro fossem viajar no final de semana. Ela não foi e ela é de touro.
Risca uma folha sob sua mesa algumas frases de músicas antigas, desenha seu nome e desiste na primeira letra: C. Acaricia o gato aos seus pés e imagina, sã em seu delírio, alguém no sofá que chama a gata, que atende e pula espaçosa no colo desse alguém que só ela, e talvez a gata, vêem.
Desiste de olhar, larga o mouse e levanta espalhando pelo tapete as migalhas da torrada integral que comeu pra tentar fazer seu intestino funcionar melhor.
As maçãs da fruteira já não prestam mais, as bananas já juntaram moscas e além disso tem o calor. Abafado como "uma tarde de merda de um domingo de bosta vendo porcaria nenhuma na tv" mas belo dia pra um pedaço de abacaxi.
Desiste do intestino que não funciona e nem tem fome e adormece no sofá da sala quente, com a tv ligada mas sem som. Dorme cerca de uma hora e mais uns 40 minutos.
Acorda com a chuva que a tira do pesadelo de seu sonho dentro de sua vida que parece outro pesadelo. Nada se ajeita, nada aparece, nada dá certo, nada funciona, nada de fecha.
Corre pra porta, desce de escadas com a cachorra atrás, esbarra no senhor do primeiro andar que entra com pães quentinhos pra um suposto café da tarde. Corre na garagem do condomínio procurando ar, procurando a chave, procurando vida. Chega na rua e deixa que chuva caia sobre ela.
"Porque a chuva, Célia, a chuva melhora tudo. A chuva tráz e leva qualquer coisa" - já dizia a sua sábia vó.